Festival Multicultural organizado por mulheres reúne vários artistas da cena Psytrance

DJs, intervenções artísticas, workshop e documentário fazem parte da programação da Zaria Festival Multicultural, que acontecerá nos dias 18 e 19 de junho. O evento online será transmitido pelas principais plataformas (Twitch e Youtube).

Zaria é um projeto com ênfase na multiplicação cultural. Desde sua primeira edição em 2015, cerca de 60 artistas, tanto nacionais quanto estrangeiros já apresentaram seus shows com os mais variados subgêneros musicais do Psytrance.

Apoiado pela Secretaria de Cultura do Estado de Minas Gerais, a primeira edição online é uma vitória para a música eletrônica. Serão 10 horas de evento, que traz interações artísticas e culturais com shows musicais, intervencionistas de circo e conteúdo audiovisual em altíssima qualidade. Além do conteúdo musical, também terá um workshop e a apresentação de um documentário sobre o cenário Psytrance do sul de Minas Gerais, onde será abordado sobre carreira, pandemia, emoções e planos futuros. Também faz parte da programação uma edição da Moonlight, uma roda de conversas de mulheres, das fazedoras de cultura do cenário, transmitida pelo canal da Cultura Cosmo, no dia 22 de junho.

Tudo isso está sendo realizado por um casal de mulheres LGBT+, Jamila Martins e Mariana Rosa.

Jamila Martins e Mariana Rosa, foto por Thiago Pessoa Nobre.

TRAJETÓRIA

Jamila Martins, também conhecida como Hera Pure, é DJ e produtora de música eletrônica e eventos, além de empreendedora, professora e digital influencer na área cultural.

Atua no setor cultural há 15 anos, ao lado de Mariana Rosa, é idealizadora dos eventos Zaria, Beatplay, Harmônica Sunset e Lozz Move, além de ter sido fundadora do Pranayama Festival e ter tido participação ativa em diversos outros eventos que desenvolveram a música eletrônica no sul de Minas Gerais.

E não para por aí, artisticamente é representada pela agência Gandhi. Também é curadora e produtora do canal Cultura Cosmo, e DJ residente do coletivo UH, MANAS! 

Mariana Rosa, por sua vez, é quem dá sustentação para que Jamila desempenhe todas essas atividades, ao atuar no desenvolvimento de design e marketing e na administração, tanto nos eventos em que atuam, quanto na Beatlife, a escola para formação de DJs.

Jamila Martins nas gravações da Zaria Festival Multicultural.

A FORÇA DA UNIÃO FEMININA 

Apesar de ter aumentado o número de mulheres presentes nos lines e nos bastidores, a cena da música eletrônica ainda é dominada por homens. Assim como outras mulheres, Jamila e Mariana já tiveram seus trabalhos desvalorizados, precisando se provarem, para serem aceitas e respeitadas.

“Nós, mulheres, temos que continuar insistindo nas outras mulheres”, “se preparem, tanto com conhecimento quanto autoconhecimento”. Essas foram algumas das palavras de Jamila e Mariana, em um bate-papo que tivemos sobre ser mulher LGBT+ no Psytrance.

Como é ser mulher LGBT+ em uma área que é dominada por homens?

Jamila: É como se você tivesse que sempre fazer o dobro, para ter o seu espaço. Por muito tempo não enxerguei isso, ou me culpei demais. Mas com meu amadurecimento e o convívio com outras mulheres, estudos e rodas de conversas, eu percebi o quanto ainda temos uma cena machista.

Mariana: O esforço é bem maior para se destacar. É como se nossa imagem não passasse credibilidade ou que seria só mais uma no meio. Porém sempre acreditei nos frutos do trabalho duro e com fé tudo se conquista independente do meio.

Vocês perceberam diferenças desde quando iniciaram na cena?

Jamila: Sim, com o passar do tempo e os resultados, o respeito ao nosso trabalho aumenta, mas é necessário provar muita coisa para que esse respeito seja sincero.

Mariana: Com certeza, mas foi depois das conquistas que começamos a ter presença e reconhecimento.

Já sofreram algum tipo de preconceito na cena de música eletrônica por serem mulheres e LGBT+? Em algum momento vocês sentiram que seus trabalhos foram desvalorizados? 

Jamila: Preconceito eu diria que não, sempre fui respeitada como mulher LGBT+, mas que o trabalho foi desvalorizado, inúmeras vezes. São poucos os que respeitaram desde lá, no início. Como o nosso parceiro Luciano Prado, que sempre afirmou respeito e admiração pelo nosso trabalho. A desvalorização era tão implantada que eu mesma chegava a acreditar que não tinha tanto valor assim.

Mariana: Sinceramente, eu acho que não por ser LGBT+. Sempre fui mais discreta, não por causa dos outros, é meu jeito. Acho que isso, talvez, não tenha chamado atenção dos preconceituosos. Mas por ser mulher sim, as coisas são mais difíceis. É como se fôssemos muito frágeis para aguentar o tranco. Senti desvalorização sim, principalmente no começo. Era muito visto como algo pequeno era um “ok” e não algo que poderia crescer.

Ainda é pequeno o número de mulheres nos lines e nos bastidores. O que falta para mais mulheres chegarem a esses lugares?

Jamila: Estamos fazendo uma análise mais profunda sobre isso, eu como curadora de alguns festivais e programações digitais, ao lado de outras mulheres, como a Lisiane Oliveira da Cultura Cosmo, temos analisado o que causa a insegurança, a falta de se sentir parte e capaz de estar nos mesmos palcos que os homens. Mas uma conclusão já é fato: nós, mulheres, temos que continuar insistindo nas outras mulheres, não podemos receber um não vou, e simplesmente deixar. Eu tenho como missão apoiar, “puxar”, insistir e sempre estar ao lado das mulheres que posso.

Mariana: Fé acima de tudo e muita mão na massa. Trabalhar e continuar com resiliência e sabedoria. Porque o trabalho devolve, sempre devolve. Um dia você colhe o que plantou.

O que vocês diriam para outras mulheres que querem entrar na cena da música eletrônica? 

Jamila: Hoje temos mulheres gigantes fazendo o trabalho na linha de frente, temos festas, canais, produções e professoras. Se não se sentiam à vontade, antes com os homens, hoje vocês têm excelentes opções no mercado. Não deixem de tentar por insegurança, todas nós somos inseguras, e ao mesmo tempo muito seguras. Está tudo dentro de nós.

Mariana: Se preparem, tanto com conhecimento quanto autoconhecimento. Quando você sabe que é boa naquilo as coisas ficam menos difíceis. E tenham um propósito, poque quando você baquear, ele vai ser a luz e a força para continuar.

Rajna Leela nas gravações da Zaria Festival Multicultural.

SUL DE MINAS GERAIS

Jamila e Mariana, ao estarem a frente de produções de eventos e de uma escola profissionalizante de Djs, já geraram mais de 300 trabalhos diretos com contratação de prestadores de serviços artísticos e estruturais em pelo menos 80 eventos presenciais e online, sempre ao lado de outras pessoas LGBT+ e de outros grupos tidos como minorias.

Tive oportunidade de participar de alguns eventos que vocês organizaram e em todos eles ouvi muitos elogias tanto aos eventos quanto a vocês. Muitos dos comentários que ouvi é que vocês dão oportunidades para pessoas da região. Por que vocês acreditam que isso seja importante?

Jamila: Não faz sentido, para mim, ser mais uma organização ou coletivo que traz somente os artistas que já se consagraram. A nossa região tem talentos, e é assim que os renomados chegaram lá, por ter tido oportunidade. Eu sou uma entusiasta da oportunidade, coloco aluno recém-formado – porém com capacidade técnica, é claro – para tocar ao lado de artistas que já fizeram seu nome no cenário nacional. E assim como na gravação do Zaria, ouço DJ de longa data elogiando os novatos, o que me dá a certeza, de que estou fazendo o certo.

Mariana: Existe muita gente boa na nossa região, muitos talentos. A maioria dos eventos ficam olhando apenas para os artistas famosos, que viajam o Brasil todo ou até outros países com sua arte e esquecem dos “menores” ou tratam eles como “ah vou ajudar a garota ali ou o cara aqui porque é meu amigo”. Digo menores em reconhecimento, mas porque estão começando, aqui tem ouro puro rs.

BEATLIFE: ESCOLA DE DJS

A Beatlife, localizada na cidade de Pouso Alegre em Minas Gerais, é uma escola profissionalizante de DJs, fundada e administrada por Jamila e Mariana. Desde 2016, forma anualmente dezenas de alunos. Seus cursos abordam técnica, gestão de carreira, marketing, produção musical, além de haver atividades focadas em streaming

Beatlife

O que te motivou a dar cursos e a fundar a Beatlife?

Jamila: O número crescente de Djs na região, tocando muitas vezes pelo “rumo” e a falta de profissionalismo que estávamos tendo que lidar, tanto quanto organizadora de eventos como DJ. Eu errei muito na minha carreira, justamente por não ter esse suporte, e não era isso que queria ver crescer em minha volta.

Mariana: Eu não fiz parte da fundação da Beatlife, praticamente “caiu no meu colo”. A Jamila tinha um sócio que por motivos pessoais saiu da empresa e ela por um certo momento achou que sozinha não daria conta. Eu sempre acreditei no projeto, vi eles fundarem e achava o máximo. E falei que eu iria ajudar e que não poderia desistir. Acredito na educação e que o conhecimento faz as pessoas crescerem. Nos da música eletrônica somos vistos como o cara que dá o play, e estamos aqui para mostrar que não é assim que funciona.

PANDEMIA

O setor cultural é um dos grandes afetados pela pandemia causada pelo coronavírus Covid-19. Sem eventos presenciais, artistas e produtores tiveram que se reinventar para continuarem trabalhando. Com Jamila e Mariana não foi diferente, ao apostarem em lives e eventos digitais, inovaram o cenário da música eletrônica no sul de Minas Gerais. 

Como a pandemia afetou os projetos que vocês estavam desenvolvendo?

Jamila: Afetou bruscamente, mas agimos rápido. Em três meses conseguimos reestruturar a forma de trabalhar, e seguimos nos adaptando e adquirindo experiência.

Mariana: Afetou demais, porque as aulas sempre foram presenciais e pelo fato de que as pessoas foram obrigadas a focarem no cuidado da própria saúde e da família saindo de casa apenas para o essencial. Mas olhando para outro lado, foi a nossa oportunidade de subir alguns degraus para crescer, porque nos adaptamos e fundamos outros projetos dentro da Beatlife. 

O cenário musical teve que se reinventar com a pandemia. Já acontecia eventos online, mas não com essa frequência que tem acontecido e não com esse investimento. Como tem sido esse processo?

Jamila: Eu já consigo, particularmente, prestigiar o evento digital como uma experiência, não é apenas um vídeo, não é apenas uma tela, tem arte ali. Então eu trabalho hoje em dia para que as pessoas consigam também, trabalhar e sentir o público, que hoje no caso é o chat, e para que o público, interaja, conheça pessoas e faça network. Eu conheci profissionais incríveis e fechei parcerias que eu jamais fecharia, se não fosse essa imersão dos eventos digitais.

Mariana: Tem sido uma experiência muito boa trabalhar no digital. O evento presencial ele dá mais trabalho antes, para deixar tudo certo para acontecer e no dia é só manter o planejamento. Agora o digital ele dá mais trabalho no momento que está sendo transmitido porque precisa envolver as pessoas e fazerem elas ficarem acompanhando. Não é algo de transmitir e deixar lá passando.

Vocês acreditam que esses eventos online vieram para ficar?

Jamila: Com toda certeza. Existe quem não se adaptou, existe quem vai se adaptar, e existe quem em algum momento vai acabar prestigiando sim, um artista, dentro da sua casa.

Mariana: Sim, vejo como uma evolução para o artista. Sem falar que aproximou mais as pessoas, no digital não tem limite geográfico. Vejo artistas desconhecidos interagindo com famosos e isso é demais. O digital se tornou o palco para o artista e mostrou quem é bom de verdade. Com a pandemia, o digital se tornou uma fonte grande de entretenimento e na sua valorização.

Atualmente, Jamila e Mariana apresentam e organizam programas online, como o Beat Papo, que são conversas ao vivo em mídias sociais, com artistas e profissionais do ramo cultural, além de aulões que abordam temas para alavancagem de carreira artística, e o evento Beatplay com artistas formados pelos cursos da Beatlife.

Beat Papo, evento produzido por Jamila e Mariana em julho de 2020.

FUTURO

Quais são as suas perspectivas para o futuro?

Jamila: Estamos animadas com todo plantio que estamos fazendo, o trabalho se estende de segunda a segunda, mas temos visto os projetos tomarem forma. A nossa evolução profissional se deve muito ao fato de ter ficado “trancadas”.

Mariana: Continuar com o crescimento e consistência. Temos muitos objetivos para alcançar ainda tanto digital quanto presencial. Nos tornamos mais fortes e aprendemos muito com essa mudança que todos foram obrigados a passar com a pandemia. Continuaremos com nossos canais no digital e voltaremos bem mais fortes para o presencial.

Antes da pandemia a cena Psytrance estava em um “boom”. Como vocês acreditam que ela estará pós pandemia? 

Jamila: Volta forte, mais forte ainda para os artistas nacionais. Quem está aproveitando o isolamento para se manter focado na carreira, tem muito a colher. E particularmente, eu notei um divisor muito nítido da cultura Psytrance focada na vivência, essência e desenvolvimento, está sendo um norte, para onde direcionar a energia e o trabalho sério que estamos construindo.

Mariana: Voltará mais robusta, porque quem não parou vai voltar com tudo, simplesmente pelo fato de que quando a gente não para com consistência, nós estamos evoluindo. Quem parou vai ter um retrabalho aí para conquistar espaço e reconhecimento. Está sendo uma grande oportunidade para os artistas.

Apesar das dificuldades encontradas, desvalorização do trabalho e pandemia, Jamila e Mariana vêm enfrentando os obstáculos com perseverança e excelência. A Zaria Festival Multicultural é a prova disso.

FESTIVAL DIGITAL | WORKSHOP | DOCUMENTÁRIO E ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

Programação Oficial:

18/06 – 19:00: DJs e Intervenção Artística
19/06 – 15:00: DJs e Intervenção Artística
20/06 – 19:00: Mastermind & Roda de Conversa
21/06 – 19:00: Workshop
22/06 – 20:00: Moonlight Especial Zaria
23/06 – 20:00: Documentário

Onde: Twitch.tvYouTube
Valor: gratuito

Realização:
Beatlife
Kumbhaka
Secretaria da Cultura do Estado de Minas Gerais

[Por Sarah Medeiros, fundadora do Jornal Folha da Mantiqueira]

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