Mulheres Sonoras entrevista: MORGANNA

Quando falamos de trajetórias de artistas que inspiram, Morganna com certeza ocupa um lugar na lista. Com uma carreira que já soma 13 anos de estrada, a artista carrega uma extensa experiência que vem do cenário mainstream até fixar de vez suas raízes no underground. Amante do Drum‘n’Bass, ela foi influenciada a entrar no universo da música eletrônica por ninguém menos que o DJ Marky, referência do gênero no Brasil e pelo mundo afora.

O começo

As festas eletrônicas são as verdadeiras responsáveis pelo começo da vida clubber de praticamente toda pessoa que se apaixona por esse meio, e com a Morganna também não foi diferente. Desde adolescente frequentava várias festas pela sua cidade, Goiânia, e numa dessas, teve a oportunidade de presenciar Laurent Garnier tocando em terras goianienses.

Um começo perfeito para quem teve contato logo de cara com um dos grandes artistas da cena House e Techno mundial, e para quem também leva o Marky na bagagem de referências, não é verdade?

Com tudo isso, chega uma hora que só ouvir música já não é mais o suficiente; é preciso colocar para fora o sentimento que ela causa, e foi assim que Morganna deu sua largada. A artista, que é formada em Odontologia, deixou o consultório de lado e mergulhou de cabeça na música com toda a força de vontade para expressar sua arte nas pick ups. Pegou emprestado equipamentos de vinil para treinar em casa, e a partir de então, o céu foi o limite. Deu o start na carreira em 2008 dividindo os decks com algumas amigas, tendo sua estreia na Festa do Tim, evento bastante conhecido na região.

Aos poucos, foi se consolidando na cena tocando House e vertentes; teve bastante destaque também através da dupla  Morganna e Thascya, que foram residentes por 5 anos de um dos eventos mais cobiçados do Carnaval do Nordeste, o Camarote Salvador. 

E a lista vai longe. Morganna já passou pelos palcos do Tomorrowland Brasil – sendo a única DJ mulher no palco da UP Club -, Green Valley, Warung, Soulvision Festival, Pacha Búzios, King Festival, Club Piso 30, na Colômbia, e em outros países como Suíça, Paraguai, Emirados Árabes e República Dominicana. Também se apresentou no Big Brother Brasil, comandando a pista da festa Burlesca, em 2012. Isso só para citar alguns. 

O caminho para o Techno

Foi com a sua ida para São Paulo, onde morou por quatro anos, que sua carreira começou a tomar novos rumos. A cidade abriu a sua mente para novas sonoridades, e o D-EDGE Club foi um dos responsáveis por apresentá-la àquele mundo que só vivendo mesmo para saber como é. 

E não tem jeito, quando o chamado techneiro acontece, é um caminho sem volta. Morganna só precisava de um empurrãozinho para embarcar de vez na cena underground, já que sempre mesclava sons mais conceituais em seus sets de House. 

E essa decisão, para ela, não poderia ter sido melhor: começou a estudar produção musical, fez sua estreia na Moving D-EDGE em 2016, entrou para o casting de artistas da D.Agency – agência do Grupo D.Edge -, se apresentou no palco Resistance, no Ultra Music Festival Brasil, em 2017, ao lado de Alex Justino; além de deixar sua marca também na 20ª edição do icônico festival Universo Paralello, retornando mais uma vez ao palco da UP Club, já no comecinho de 2020. 

Não poderíamos deixar de destacar uma das apresentações que marcou a sua carreira: o bloco D-RRETE em 2019, organizado também pelo Grupo D.Edge no Carnaval de São Paulo, foi o evento que a colocou na mira dos gringos, e com isso ela desembarcou em um dos lugares mais históricos da música eletrônica: Detroit, o berço do Techno. 

Músicas

Toda a personalidade artística de Morganna construída ao longo desses 13 anos também são traduzidos na produção musical com lançamentos em gravadoras como Nin92wo, MUR e Muzenga Records. Sua produção mais recente foi a faixa Smut, lançada no VA de 20 anos do D.Edge.


Falando em produção, Morganna atingiu mais um marco em sua trajetória: ela foi convidada a fazer parte de uma compilação de remixes de uma das artistas mais ilustres do Brasil: Rita Lee! Com lançamento previsto para junho, recebeu a missão de dar uma nova roupagem para a faixa Vítima, e afirma que esse foi um dos maiores desafios até aqui.

Cena underground em Goiânia

Enganam-se fortemente aqueles que acham que em Goiânia só existe sertanejo. Existe uma outra realidade, bem mais interessante e diversificada, que se apresenta para aqueles que se dispõem a ir além do óbvio.

O circuito eletrônico underground na cidade está cada vez mais consistente com grandes artistas e eventos que fomentam ainda mais essa cultura, e podemos dizer que Morganna tem grande participação nisso ao criar, junto com Alex Justino, uma das principais festas referência na cena local: a Lost & Found, que acontece duas vezes por ano e já trouxe nomes como L_cio, Blancah e Wehbba.

Foto: Lost & Found


Personalidade. Dedicação. Essas palavras expressam bem os caminhos que trouxeram Morganna até aqui, transformando-a em uma das principais representantes femininas da cena underground, além de contribuir para levar o nome de sua cidade ao centro das atenções quando o assunto é música eletrônica no Brasil.

Não deixamos passar a oportunidade de saber mais sobre toda essa trajetória, e você pode conferir nosso bate papo a seguir:

Você tocou por muitos anos na cena comercial. Quando foi que você decidiu que era hora de mudar de estilo? 

Quando percebi que o que eu estava tocando não me agradava mais tanto quanto os novos sons que eu estava experienciando.

Ao longo desses quase 13 anos de carreira, quais foram os maiores aprendizados, principalmente enquanto artista mulher numa cena majoritariamente masculina?

Em geral, passar por preconceito para se impor como mulher, acaba nos tornando mais fortes, e isso explica a necessidade do feminismo. Sabemos que ainda temos um longo caminho, mas a chave é não desistir por mais desafiadora que seja a situação. O limite você estabelece.

E os maiores desafios?

Viver da música e ser reconhecida pelo seu trabalho é um desafio diário. A produção musical exige muita dedicação, estudo e prática para poder evoluir, é um processo gradativo. E eu costumo dizer que serei uma eterna aprendiz.

Quais são suas principais referências atualmente dentro do Techno e da música de uma maneira geral?  

Eu escuto muitos artistas e posso dizer que tenho várias referências. Dentro do Techno, pra tocar, gosto muito da pegada do Oscar Mulero, Rodhad, Keikari, Keith Carnal, Shlomo entre outros.

E outros estilos, tenho uma lista extensa de preferidos, Dope Lemon, Mild Orange, Rhye, Ame, Sevdaliza, Bob Moses, Moderat, e por aí vai…

Falando em referência, você foi convidada a fazer um remix da música Vítima, da Rita Lee. Como aconteceu esse convite e como foi a experiência de criar esse remix?

Eu sou fã número 1 da Rita, então dá para imaginar minha emoção, né! Recebi o convite de um grande amigo que também é DJ, o João Lee, filho dela, que teve a brilhante ideia de selecionar alguns produtores e fazer uma compilação com 3 volumes de remixes dos maiores clássicos da Rita Lee & Roberto. O primeiro já foi lançado e está disponível em todas as plataformas digitais. O meu remix vai sair em junho no vol. III com um time de peso do Techno.

Quais diferenças você enxerga entre a cena mainstream e underground, sobretudo em relação ao machismo?

Eu particularmente acredito que cada segmento musical seleciona seu público de acordo com seu estilo de vida, suas atitudes, suas opiniões, seus valores e hábitos. Vejo que na cena underground a galera se conecta mais com a música, todo mundo é livre para ser o que quiser e o respeito com o próximo.

Você foi a única mulher no line up da Up Club no Tomorrowland 2015, certo? Na sua opinião, por que ainda não vemos um número expressivo de mulheres ocupando espaços de destaque na cena?

Porque infelizmente ainda somos minoria na cena. E oportunidades se espera andando. Go girls!

O que você acha que falta para conquistarmos uma cena mais igualitária?

Iniciativa! O poder de fazer acontecer. Transformar a intenção em ação, o desejo em realização e as oportunidades em acontecimentos.

Uma gig inesquecível?

Gravação da BE-AT.TV do Bloco D-rrete 2019 em SP. Que dia!

Como foi pra você tocar em Detroit?

Foi irado! O lugar era uma galeria de arte em uma sala comercial de prédio com a pegada bem industrial, a cara do Techno. A pista foi super receptiva com meu som, fui muito bem recebida e acredito que voltarei em breve!

Você procura sempre construir uma conexão com o público quando está tocando. O que você considera mais importante na hora de fazer essa construção?

Eu procuro sempre fazer uma construção coerente durante meu set. Minhas pastas são todas separadas por tons, o que ajuda bastante na escolha das tracks. Eu me divirto muito tocando, amo fazer mixagens longas, é o meu momento de entrega…e acho que a pista absorve tudo isso e acaba se conectando.

Seu último lançamento foi a faixa Smut que saiu no V.A de 20 anos do D-Edge. Podemos esperar mais lançamentos pela frente?

Fiquei muito feliz em fazer parte desse VA e com o resultado da Smut. Produzir neste momento, confesso que não está sendo uma tarefa muito fácil. Mas sim, muito em breve teremos mais lançamentos.

Agora a pergunta master da coluna: qual conselho você daria para artistas mulheres que estão buscando seu espaço na cena? 

‘Quando acreditamos apaixonadamente em algo que ainda não existe, nós o criamos. O inexistente é o que não desejamos o suficiente.’ Franz Kafka.

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