Conheça o INSTINTO: coletivo brasiliense que fortalece a cena eletrônica feminina

Quando falamos da cena eletrônica feminina no Brasil a gente se depara com algumas questões que valem – e muito – a nossa reflexão: onde estão as DJs e produtoras brasileiras? Por que não temos muitas artistas femininas ocupando a metade dos line-ups dos eventos país afora? Essas são só algumas das várias perguntas que permeiam a realidade das mulheres que seguem o sonho de viver pela música em um campo praticamente inteiro dominado por homens.

E é aí que, quando paramos para analisar todo esse território, nos deparamos com o trabalho de grandes artistas como Eli Iwasa, Groove Delight, Cashu, Thaís Barja, Blancah, Fernanda Pistelli… só para citar algumas. Porém, nós queremos mais, e sabemos que a caminhada para conquistar este espaço é longa, mas já podemos ver o quão longe podemos chegar. 

A representatividade no espectro da música eletrônica é uma pauta essencial quando falamos de grupos minoritários ocupando espaços de destaque, e é por ela que muitas mulheres começam a criar seu próprio caminho neste mundo, encorajando outras a logo irem atrás. E isso é exatamente o que acontece com o Instinto, coletivo de Brasília – DF, que estreia a nossa série Mulheres Sonoras. A intenção desta série de matérias/entrevistas é mostrar artistas e projetos incríveis das manas que movimentam a cultura da música eletrônica pelo Brasil e que merecem nossa total atenção.

Como tudo começou

O coletivo, lançado em 2020, foi pensado por quatro amigas que resolveram juntar suas bagagens em torno da música eletrônica e criar um grande projeto que tem o objetivo de fomentar e fortalecer mulheres envolvidas neste ramo, tanto artistas quanto as profissionais que trabalham nos bastidores fazendo tudo acontecer. A ideia teve seu início bem ao final de 2019, e com a pandemia do Coronavírus e uma realidade sem festas, elas sentiram que era a hora de colocar em prática. 

E quem são elas?

Estamos falando de um quarteto formado por 3 DJanes e uma empresária atuante neste universo: Bruna Val, Gabby, Priscila Martins e Sadra. Todas residentes em Brasília, usaram a vontade crescente de fazer algo a mais pelo meio para dar início ao projeto, que podemos dizer que é uma verdadeira rede de apoio mútuo entre mulheres buscando formar uma cena mais igualitária.


O que as fizeram chegar até aqui, afinal? 

Se a música foi o que as uniu, a trajetória de cada uma também foi movida por ela, e é claro que não podemos deixar passar batido, então, vamos às apresentações:

BRUNA VAL

Bruna iniciou sua carreira como DJ há 8 anos. Começou tocando com computador, ia para os eventos de ônibus com os equipamentos na mochila, e ainda que seu caminho fosse desafiador sendo mulher preta e lésbi.., a paixão pelo que faz sempre a guiou, colocando nos decks todo seu feeling para proporcionar a melhor experiência ao público. 

Com esses anos de experiência, Bruna levanta a bandeira da representatividade negra e LGBT, servindo de inspiração a todas aquelas que por algum motivo têm medo de se arriscar.

” Eu sei de várias meninas que às vezes pensaram em tocar se sentindo presas por pensar que não iam ter ajuda… o Instinto está totalmente disponível para trocar ideia; para quem não sabe por onde começar e está meio perdido, vem falar comigo, pergunta. Queremos apoiar todas que estão no meio artístico. Queremos ajudar todas as mulheres que não têm voz.”

GABBY

Gabby entrou no universo da música eletrônica de maneira natural. Ouvia música eletrônica pela rádio, o que a levou a frequentar as festas, onde afirma ter ficado  fascinada com a energia. Caminho sem volta! 

Gabby costumava fazer lives nos eventos que ia e dava todo apoio aos artistas da sua região. A partir daí logo entrou na produção de eventos, lançando a sua primeira festa com 24 horas de duração. 

Em 2017 iniciou sua carreira como DJ com o projeto Razam, e atualmente vem investindo na carreira solo, além de comandar a filial em Brasília da escola Chilena para DJs e produtores: Technicals. 

PRISCILA MARTINS

Priscila é daquelas fãs de música eletrônica que não se contentam apenas com o papel de ouvinte. Frequentadora assídua de eventos há mais de 10 anos, criou a Vip Music –  empresa que trabalha com divulgação de eventos, Marketing para DJs e o que mais a conectar com o meio eletrônico.

Estudante de Publicidade e Propaganda, sempre trabalhou com conectar pessoas e é isso que desperta o seu melhor. Priscila realmente está em casa.  Na ambição de fazer algo a mais pela cena feminina, teve a ideia de fazer lives apresentando artistas pela Vip Music, mas algo lá no fundo já despertava o desejo de ir além. As ideias das integrantes se integraram e o resultado a gente está vendo aqui. 🙂 

SADRA

Sadra começou a frequentar as festas eletrônicas aos 17 anos, e a princípio o seu interesse em ser DJ não era para tocar em festas ou festivais, mas sim, no After! Quem não ama um bom After, não é verdade?

Foi então que, em 2015, influenciada por um amigo, aprendeu a tocar, iniciando como DJ logo em 2016 como um duo. Em 2018, lançou seu projeto solo, e desde então, a artista une seu feeling, musicalidade e técnica, se apresentando em selos brasileiros renomados, como o cultuado 5uinto, e no maior festival de cultura da América Latina, o Universo Paralello. 

O projeto

Quando mulheres se unem e dão o primeiro passo em busca de um objetivo, um mundo de possibilidades se apresenta e a gente realmente percebe que o céu é o limite. “Eu acho que o Instinto deu um start em muitas meninas que viram o projeto começando”, comenta Bruna Val. É nisso que se baseia um dos pilares do coletivo: inspirar outras mulheres.

O poder das mulheres se torna muito maior quando encorajado por outras, com isso, o Instinto também traz a missão de enaltecer o papel da mulher no mundo artístico, criando um espaço de apoio para que as profissionais possam divulgar seu trabalho, seja diante dos decks ou nos bastidores. E não somente dar visibilidade para quem já trabalha no meio, mas também ajudar aquelas que almejam entrar.

“A gente não quer ser só mais um coletivo. A gente quer contribuir para a cena, assim como a cena já contribuiu pra gente também”, diz Gabby.

Por que Instinto?

O nome carrega um significado simbólico para além de um impulso natural: “O fato do INSTINTO feminino ser considerado aguçado (não possui afirmação científica), pode estar ligado a luta das mulheres para sobreviver em um sistema social com heranças históricas patriarcalista. Com o tempo e através de muita luta, as mulheres vem conseguindo aumentar o seu espaço” afirma o coletivo.

Trabalhos

Uma das formas de divulgação das artistas é em formato de livestream. As lives são transmitidas no canal do Youtube do coletivo que você pode conferir aqui.

Em quase 1 ano de projeto já passaram artistas dos mais variados estilos e regiões do país, contando também com atração internacional: Ana Jones, Bianca Pio, Heleni Anna, Vivi An, Gabi Villis, Nimic, Carla Cimino, Amandy, Selene, Lana Gamarra, Caleena, Masicaya (Colômbia) e Kelly Moreira.

Entrevistas

Outra frente de atuação é a série de entrevistas Por dentro dos bastidores, trazendo bate-papos enriquecedores com profissionais que atuam no backstage, mostrando que existe um universo imenso por trás de grandes eventos e artistas que precisa ser exaltado.

Alguns nomes que já passaram por lá: Taty Cardoso, Produtora Artística que já trabalhou com Alok, Devochka, Neelix e Skazi; Sarah Magalhães, idealizadora do projeto Varanda BSB e Camila Motta, responsável pela área financeira do maior festival de cultura alternativa da América Latina: Universo Paralello!

Chuva de experiência! Você pode conferir tudo em: https://www.instagram.com/instinto.br/

Podcasts

Elas não param e lançaram recentemente o podcast no Mixcloud mostrando ainda mais talentos. O podcast já conta com sets de Fernanda Pistelli, Nana Kohat, Barbie Melo e a lista só cresce! Confira todos em: https://www.mixcloud.com/instintobr/

O Instinto está apenas no seu começo traçando voos cada vez maiores para fortalecer ainda mais a cena. E o que mais elas pensam sobre isso? Confira!

1. Vocês têm uma iniciativa incrível de mostrar o trabalho de mulheres nos bastidores. Como vocês enxergam a importância delas nesses espaços?

Priscila: Sempre tivemos contato com mulheres incríveis da produção, eu sou a única do grupo que não é DJ, mas faço parte da equipe que trabalha nos bastidores, que acaba não sendo muito notada.

Bruna: Sentimos a necessidade de mostrar esse trabalho tão representativo, que às vezes passa despercebido aos olhos do público.

Sadra: A ideia foi mostrar um pouco mais sobre isso, a história dessas mulheres e o que elas fazem, para aumentar a percepção do público sobre a importância desse nicho.

2. Como vocês analisam a cena eletrônica nacional para as artistas femininas hoje?

Gabby: Eu iniciei essa vivência por trás dos bastidores e sempre me questionei o porquê disso, vejo falta de apoio e incentivo, por ser uma profissão com o público masculino em grande quantidade, porém o necessário além da força de vontade é o talento que consequentemente está aí para todos.

Sadra: É algo também que está em ascensão, temos cada vez mais mulheres apresentando trabalhos incríveis, em vários setores do entretenimento, expandindo ainda mais as possibilidades.

3. A gente sabe que ainda vivemos em uma cena bem machista, né? Vocês sentem alguma resistência ou preconceito no mercado ao buscar parcerias com o projeto?

Bruna: Pelo projeto não. Ao contrário disso, tivemos apoio e uma aceitação bem bacana.

Sadra: Inclusive recebemos um convite muito especial da Infinu, feito pelo Ernani e Miguel, para colaborarmos com a Temprano, que acontece aos domingos nesse espaço novo aqui em Brasília!

Priscila: Isso mesmo, a Infinu é um ambiente incrível e contemporâneo, que mistura gastronomia, arte e música boa.

Gabby: Recebemos também indicações de muitas mulheres talentosíssimas por todo o país, levando em consideração que a ideia inicial era apenas de forma local em Brasília, onde residimos, mas os laços que todas nós criamos com o meio nacional fizeram com que expandíssemos o projeto.

4. Neste quase 1 ano de trabalho, qual foi o maior desafio enfrentado até agora?

Priscila: Acredito que conseguir conciliar a rotina do dia a dia com as demandas do projeto.

Bruna: Por exemplo, tive dificuldade em organizar meu tempo para produzir, pesquisar, estudar, trabalhar e colaborar com o Instinto.

Gabby: Todas nós precisamos conciliar o projeto com a correria do dia a dia.

Sadra: Isso mesmo, porque conduzir o projeto demanda muito tempo, requer reuniões, pesquisas e dedicação.

5. Temos mulheres incríveis atuando tanto como artistas quanto como produtoras, mas ainda assim não é na proporção que gostaríamos. Na opinião de vocês, o que falta para que mais mulheres marquem presença nesses espaços?

Bruna: Ainda não temos um número igualitário, mas é algo que está evoluindo. Talvez isso seja vestígio de uma sociedade que até pouco tempo atrás condenava as mulheres que queriam assumir profissões “masculinizadas”. Isso ainda reverbera nos dias de hoje, fazendo com que questionem principalmente a nossa capacidade. 

Priscila: Talvez uma forma de ajudar nesse processo seja questionarmos de volta a sociedade. Você, produtor, tem colocado mulheres para tocar na sua festa? E para trabalhar na sua equipe? A “desculpa” que não temos mulheres capacitadas já não se encaixa mais nessas perguntas, pois temos um número muito grande de mulheres apresentando trabalhos incríveis e conquistando cada vez mais seu espaço.

6. Quais os próximos passos da Instinto e onde almejam chegar?

Bruna: Queremos continuar com os quadros e expandir ainda mais a curadoria, trazendo cada vez mais mulheres de diferentes personalidades e setores da música eletrônica.

7. O que vocês diriam para as manas que querem entrar neste meio mas têm algum receio de arriscar?

Gabby: Esforço e dedicação são os primeiros passos para qualquer realização. Faça com amor e tudo estará favorável para o sucesso.

Sadra: Nosso objetivo também é incentivar, de alguma forma, quem está começando. Acho que as entrevistas, principalmente, têm um papel muito importante para quem quer dar aquele pontapé inicial, porque abordamos diferentes histórias que contam o início de cada uma no universo da música eletrônica.

Priscila: O segredo é: “Está com medo? Vai com medo mesmo”. Os primeiros passos sempre serão os mais difíceis, mas com persistência e estudo se chegará longe.

Bruna: É isso! Estude, se esforce, pratique e se isso é realmente o que você quer, apenas comece, não desista e conte com a gente! (Risos)

Para acompanhar de perto:

Bruna: https://www.instagram.com/djbrunaval/
Gabby: https://www.instagram.com/djgabby.br/
Priscila: https://www.instagram.com/pri.mbmartins/
Sadra: https://www.instagram.com/eusadra/